Os pequenos

Com o carro na oficina, busco as vantagens de ir trabalhar de metrô. Além dos vinte minutos de caminhada, posso olhar a cidade, descobrir coisas novas ao lado de casa, observar as pessoas. Nem sempre essas possibilidades me animam. Ontem, com o dia nublado, garoa, só pensava na minha cama, cobertas e livros. Hoje não, céu limpo, um dia lindo de sol e frio.
Na estação Faria Lima passo a catraca e tenho que enfrentar a linha contínua de pessoas que saíram dos trens e se dirigem à saída. Ainda não parei para tentar entender algo tão estúpido quanto fazer a massa dos que entram ter que cruzar com a multidão que sai. Enfim... No meio da multidão, desacelero para não esbarrar em um homem anão que vem na direção contrária, também com a cara apressada dos que vão para o trabalho. Pego o trem  e vou até a República, onde desembarco para pegar a linha vermelha. Desço a primeira escada rolante e pouco antes de descer a segunda vejo outro anão vindo na mesma direção. Impossível não pensar que é uma coincidência curiosa ver dois anões em um tempo tão pequeno. Mas esse não é uma pessoa comum como o outro, esse é uma presença! Jovem, bonito, vestido de uma maneira que chama a atenção pelas cores, pela harmonia – calça jeans clara meio acinzentada, camiseta cinza, uma camisa xadrez de uma cor viva bonita por cima para proteger do frio. Usa fones de ouvido externos de uma cor próxima ao vinho, com algo meio brilhante no meio, como se fosse areia ao sol. Parece mal humorado, deve ser duro ser observado todo o tempo, por todo mundo.

Entro na escada e ele vem atrás. Entramos no mesmo vagão, eu por uma porta, ele por outra, me sento, ele fica em pé, encostado na divisória de metal que dá para os bancos. Entre nós há uma mãe também em pé, com o filho de uns seis anos. O garoto fica hipnotizado pelo jovem anão, olha o moço sem nenhum disfarce. Eu deveria pensar em preconceito mas não consigo, ele parece uma criança em frente a um ser que achava ser imaginário, como fadas e gnomos. A mãe não parece notar o rapaz, nem o encantamento do filho. Fico com vontade de jogar o menino para valer em uma história de fadas. Dizer que o rapaz é um príncipe de um reino mágico, dotado de grandes poderes e que está visitando nosso mundo. O trem aproxima-se da outra estação, pego o celular na bolsa para ver as horas, ao mesmo tempo percebo que a mãe vai descer com o garoto. Olho as horas e ergo a cabeça. Sumiram todos, inclusive o anão. Olho o trecho da estação que consigo ver, nenhum sinal dos três. Por um pequeníssimo pedaço de tempo me sinto na história que imaginei contar.

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