Lá fora, no mundo

       Primeiro foi uma foto dele na praia, de chapéu.  Tomou um susto, era a imagem de um homem aquela. Em que momento ele deixara de ser um adolescente? A mudança acontecera fazia pouco tempo, tinha certeza, mas era impossível precisar em que momento surgira aquele rapaz. Há tempos notava um andar seguro, com aquela qualidade elástica dos cavalos novos no pasto, prontos para correr por puro desejo, sem obedecer a ninguém, prontos a balançar as crinas e saltar. Mas agora era diferente, não parecia haver mais pasto, só uma imensa campina sem cercas, a ser experimentada em sua inteireza.
Uns quinze dias depois outra foto trouxe a certeza, seu filho era um homem agora. Jovem, muito jovem, cheio das dúvidas e buscas, mas um homem. Na foto ele está em um barco com os amigos. Sabe a história da foto. Ele voltava de um passeio, brincava com um cajado e voltara-se para a amiga quando pressentiu que ela ia fotografá-lo. Há uma enorme energia nos braços, e um olhar, ah, aquele olhar!
Lembra de ter ouvido de alguém “filhos pequenos dão mais trabalho mas os grandes dão mais preocupação”. Sempre gostou dessas sabedorias de avó, sem nuances, simples, diretas, como são as explicações de crianças, as parábolas, as fábulas. Quando ele era pequeno havia todo o trabalho: dar de comer, trocar a roupa, escovar os dentes, colocar na cama e muitas pequenas coisas desse tipo. Havia também as histórias lidas de noite, os desenhos animados, os filmes no cinema, os passeios no parque. Hoje o número de coisas que fazem junto diminuiu, ficaram as conversar em torno da mesa, as melhores, que nunca mudam. Ainda hoje a vontade é de mantê-lo o mais possível em casa, longe de todos os perigos. Às vezes o coração dispara quando ele está fora. Mas ainda assim, o solta, deixa ir.
Ouviu uma das experiências da viagem. Três e meia da manhã um pequeno grupo de moças e rapazes saiu do hotel, pegou uma trilha escura no mato e foi até a praia. Escuridão quase absoluta, noite quente. Ele entrou na água, a cada movimento que fazia o mar se iluminava com uma luz branca. Boiando, ele olhou o céu absurdamente estrelado até perder um pouco a noção de onde estava. Seu coração aperta com a intensidade da experiência, pode imaginá-lo contando essa história para os netos. E imagina uma mãe dizendo: é madrugada, não é hora de ir para a praia, é perigoso, é hora de dormir. Só então descobre como uma certeza no corpo, física, e não racional, porque eles saem, e porque os deixamos ir. É para que vivam profundamente, muito mais do que permite a domesticidade. Para que juntem experiências, para que se emocionem, para que conversem madrugada adentro até amanhecer, para que amem, sonhem com outro mundo, trepem, conheçam coisas. E para que depois narrem o vivido. 

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