Um daqueles sábados com poucas
obrigações. Nenhum supermercado a ser feito, nada a ser consertado, nada exigindo
que eu corra. Acordo no meio da manhã para fazer unhas. Depois de muitos fins de
semana em que não tive tempo, deixo cuidarem um pouquinho de mim, enquanto
corre uma conversa leve a base de filhos, gatos e sonhos. Unhas feitas, pés
macios, tomo o rumo da praça Benedito Calixto. Mesmo no meio do dia nublado, de
céu pesado, imagino que ela esteja lotada nesses tempos de cidade cheia dos
turistas que vieram atrás da Copa. Não vou circular na praça propriamente,
quero comprar uma faixa de cabelo numa das lojinhas coletivas do entorno.
Acerto na previsão, a calçada da praça exige uma atenção constante para evitar
esbarrões. Do outro lado da rua, um moço toca uma música pasteurizada que
parece sair de um gravador estranho. Não chego a entender se ele toca algo ou
só reproduz, e me pergunto se ele realmente gosta daquilo. Vejo alguém se
aproximar dele e concluo: sim gostam, há algo meio previsível e melado na
música que talvez lembre a todo mundo aqueles velhos amores adolescentes. Insisto
mais um tempo no meio das pessoas mas me canso. Para fugir do massacre, atravesso
a rua, ando um pouco pela calçada oposta. Logo estou na lojinha em que queria
ir, faço minha compra e saio novamente à rua, talvez para voltar para casa.
Mas agora há outra música. Um
pouco à frente, na mesma calçada, um grupo de cinco rapazes toca em uma
formação pouco usual para músicos de rua: violoncelo, clarineta, bateria,
acordeom e violão. Atravesso a rua, agora para vê-los melhor. São jovens,
provavelmente têm menos de 30 anos. Percebo que montaram uma cena. Vestem-se
com roupas que parecem antigas, calças de alfaiataria ou de sarja, camisas,
coletes, casacos com um ar meio fora do tempo. Dois usam boinas, um está de chapéu.
Atrás deles, como fundo do cenário, um prédio baixo com duas grandes janelas na
frente, a parede totalmente tomada por uma trepadeira bem verde. Nada típico
desse tempo, nada que mostre que estamos em São Paulo. Tocam com imenso prazer,
daquele prazer que só músicos parecem conhecer. Junto de mim as pessoas param,
ouvem, fotografam, filmam. Um carinha aproxima-se deles, faz um gesto com a
cabeça como quem pede licença, e joga 2 reais na caixa do violoncelo aberta na
frente do grupo. A música fica mais alta, os músicos parecem mais felizes, o
cantor ergue a voz e insiste:
And now that
you took that part,
that used to be my heart
All of me
Why not take all of me?
Sorrio sozinha, sorrio como as
pessoas à minha volta. Procuro na carteira para ver se tenho trocado, para meu
dia foi um grande show. Nada, minha carteira é um deserto, fico na esperança de
encontrá-los outra vez. Escuto mais um pouco e me vou, quase dançando.
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