Nos
últimos meses passei a seguir muita gente no Instagram. Saí da rota dos amigos
e fui descobrindo fotógrafos. A coisa começou assim - primeiro comecei a seguir alguns coletivos,
depois os fotógrafos que apareciam nesses coletivos, depois fotógrafos que
esses fotógrafos seguiam. Dito assim, parecem milhares mas não é exatamente
isso. A maior parte deles fotografa em preto e branco e tem um olhar muito
particular sobre o veem. Poucos fazem fotos só bonitas, alguns fazem fotos
estranhas. Essa escolha em que fui deslizando deu no seguinte.
Minha
fotógrafa predileta entre todos mora em Istambul. Muitas vezes não consigo nem
imaginar como as fotos foram feitas, como ela conseguiu aquele clima de sonho,
o quanto ela manipulou a imagem, mas penso sempre em uma foto em que um homem
está encostado na parede, perto dele um gato dorme no parapeito da janela e lá
fora, no meio de uma tempestade de neve, entrevemos um vagão de trem. Alguém
poderia escrever um romance a partir dessa imagem. Há mais um turco na minha
lista. Ele é jovem e às vezes faz selfies de uniforme. Muitas fotos são bobas,
não me agradam, mas ele fotografa a mesquita da cidade, as rugas dos velhos e o
olhar brilhante das crianças de uma maneira que me comove.
Saindo
da Turquia há uma fotógrafa iraniana. Jovem e bonita, ela cobre os cabelos com
um lenço amarrado como um turbante. Suas fotos são um assombro, não há um
ângulo tolo, uma foto banal. Ela me faz ter vontade de estar lá, de olhar o que
ela vê.
Há
também um fotógrafo russo. Ele aperta meu coração, tudo é sempre depressivo e
triste, com cores de polaroid, de foto dos anos 1970. Há uns homens com aparência
militar, alguns belíssimos. Nem com o tradutor chego a entender muito bem os
textos longos que ele escreve. Mas paro, olho as fotos, olho e olho, tento compreender aquela tristeza toda.
E
tem o fotógrafo da Nova Zelândia que fotografa pessoas
em situação de rua. Uma boa parte delas pertence às comunidades indígenas que
foram massacradas no país. Lá estão seus rostos tatuados, às vezes vejo um
grande orgulho e dignidade, às vezes uma tristeza sem fim.
Por
que resolvi falar sobre fotografia, eu que brinco que sou meio cega? Porque
hoje me peguei pensando no quanto aprendi a respeitar outros lugares e outros
jeitos de viver a partir dessas imagens. Admiro as duas fotógrafas dos países muçulmanos. Seja lá
a vida que elas tenham ou o que pensam, elas fazem mais pela minha ideia de
diversidade do que zilhões de discussões teóricas. O fotógrafo turco me ensina
um olhar distante do meu, preciso não fugir do que acho tolo. O russo me
entristece e fala de dor. O neozelandês me toca por me dar a sensação de que olha o mundo do exato lugar onde estou. Nesses
tempos em que a raiva parece ter se tornado o sentimento número um a aflorar em
quase todos – eu também caio nisso com mais facilidade do que gostaria – poder olhar
o outro totalmente desarmada é bom. Poder olhar sem a mediação das palavras
talvez seja o maior exercício de empatia desses tempos estranhos.
(Caso
alguém tenha curiosidade para ver as fotos dessas pessoas: sznpkt,
fatih_mehmet_ozdemir, elnaz_aminii, dcim.ru, johnniecraw).
Perfeito. Olhar, desarmado.
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