Pesadelos coletivos

 


Não costumo ter pesadelos, meus sonhos aflitivos são sobre o mar e sua força. Inúmeras interpretações podem vir daí, o mar é tudo o que não controlo e sinto como ameaça, mas que, muitas vezes, também traz beleza e maravilhamento. Nos últimos dias, desde que descobriram os corpos de Bruno e Dom, isso mudou. Em duas noites sonhei com assassinatos e nesta última noite sonhei que estava envolvida em uma disputa de terras e atacava o inimigo enfiando uma caneta em sua barriga como uma arma. Ele não sentia nada, ignorava completamente meu ataque e acordei assustada. Brinco com alguns amigos que certos sonhos não precisam de um analista para serem desvendados, vêm com legendas explicativas. O que podem os que escrevem contra os que destroem a vida em suas mais diversas formas?

O neurocientista Sidarta Ribeiro diz que experimentamos nos sonhos futuros possíveis. Se for assim, meus sonhos iluminam um futuro de pura destruição. É para lá que temos ido. Ontem li que uma área equivalente a dois mil campos de futebol é desmatada todos os dias na Amazônia e não tive coragem de ler a matéria inteira. Há poucos dias vi que Altamira, no Pará, é a campeã em emissão de gases de efeito estufa no Brasil. Desmatamento, mais uma vez. Descubro que algumas cidades espalhadas por lugares como Paquistão e Índia podem atingir em breve temperaturas tão altas a ponto de impedir a vida humana por muito tempo.

Pelo vidro da janela, vejo que um pé de quebra-pedra nasceu numa brechinha da esquadria onde há uma mistura de limo e poeira e já tem uns três raminhos. A vida tem uma disposição feroz em seguir. E é bela. No domingo frio sigo tentando descobrir por que como espécie nós, humanos, buscamos tão avidamente a extinção.


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